A LEITURA POPULAR DA BÍBLIA

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3 de outubro de 2022 por Ir. Mercedes Lopes - MJC

Uma ligação entre a situação em que vivemos e a leitura da Bíblia tem sido um fator de crescimento na fé e motivação para analisar com mais participação e ousadia serena a realidade sócio política e eclesial em que vivemos. A Leitura Popular da Bíblia possibilita uma visão mais profunda e crítica da conjuntura atual. Esta metodologia da LPB desperta um compromisso comunitário para assumir posturas e ações mais coerentes com o Evangelho de Jesus. Desta leitura bíblica em conjunto, em diálogo consciente e comprometido, brota um novo modo de compreender Deus e de viver a fé.

Aos poucos, aquelas imagens de um Deus castigador e distante, aprendidas na infância e acentuadas na adolescência vão ficando diferentes. Elas vão apresentando os traços do rosto do Abbá de Jesus. Antes desta leitura, eram imagens que acentuavam um Deus forte, poderoso, exigente, intransigente, moralista. Deus castigador do mal e recompensador do bem, cuja imagem estava comprometida com um modelo vertical de sociedade: o patriarcado. Esta imagem de Deus vai se modificando na medida em que as comunidades começam a experimentar Deus presente na vida cotidiana, através da leitura da Bíblia e da partilha da realidade, com suas perguntas bem reais e desafiadoras.

A leitura da Bíblia ligada à realidade e o compromisso de lutar em conjunto para enfrentar situações injustas, geram relações de amizade e companheirismo. São essas relações de proximidade e cumplicidade que ajudam as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) a fazerem uma experiência de Deus que escuta o grito dos pobres, Deus que está caminhando com seu povo oprimido (Js 1,5). Deus da vida, gratuito, solidário, livre e libertador, dinâmico, presente na história: “Eis que eu estarei com vocês todos os dias, até o fim do mundo” (Mt 28,20). Esta nova experiência de Deus confirma a caminhada do grupo, atraindo mais participantes e exigindo maior conversão e entrega ao serviço do Reinado de Deus.

Uma nova experiência de Deus que transparece nas celebrações do grupo, ao final de cada estudo, aonde a vida sofrida do povo aparece com muita simplicidade e realismo. Com os olhos iluminados pela fé, nem a dor, nem a opressão, nem a morte têm a última palavra, porque a experiência da presença de Deus no cotidiano da vida torna-se transparente. Então a Palavra de Deus torna-se de fato Boa Nova, pois é portadora de uma promessa de vida e de uma convocação que levam as Comunidades Eclesiais a se comprometerem na luta por “vida em abundância para todas as pessoas” (Jo 10,10).

Este jeito de ler a Bíblia começou entre os anos de 1968 a 1980, quando a Igreja da América Latina viveu um novo Pentecostes, depois do Concílio Vaticano II. Era um contexto de repressão. As ditaduras militares causavam medo, tortura e mortes. Muitas pessoas foram presas, torturadas, estavam desaparecidas. Iluminadas por Documentos Conciliares, relidos pela Assembleia do CELAM, em Medellin 1968,  nasceram as CEBs nos meios populares, como presença bem visível da Igreja. Era um fermento eclesial, no meio dos pobres, fazendo crescer a fé e a esperança.

As CEBs se tornaram, então, um espaço onde os pobres se encontram para celebrar a fé iluminada pela Palavra de Deus e ligada com a realidade concreta e desafiadora do seu cotidiano. Dessa ligação surgem força e coragem, resistência e criatividade para descobrir novas alternativas de vida. Este Kairós iniciado em Medellín (1968), foi retomado e fortalecido em outros encontros do CELAM, especialmente em Puebla, onde se constatou que as pequenas comunidades cristãs ajudaram o povo da América Latina a alcançar um conhecimento mais profundo da Palavra de Deus e, com esta espiritualidade, assumir um compromisso social em nome do Evangelho.

A importância das CEBs foi novamente reconhecida na Assembleia de Aparecida, em 2007, cerca de 39 anos depois da Assembleia de Medellín. Nas Comunidades Cristãs da América Latina a Bíblia lida em comunidade, ligada com a realidade (Leitura Popular da Bíblia) proporciona novos espaços para leigos e leigas assumirem o compromisso de aprofundamento contínuo e, dessa maneira, se tornarem sujeitos comprometidos/as com a caminhada da Igreja no mundo de hoje. Leigas e leigos que assumem a missão de ser Igreja em saída na inclusão e na comunhão, em caminhada conjunta, como pede o Papa Francisco.

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